sexta-feira, 6 de agosto de 2010

O senhorio

Apesar de estar esquecido, Robert Graves (1895-1985) era um escritor muito interessante. No início dos anos 80 esteve na moda por causa da série de televisão Eu, Cláudio, aliás uma das mais fantásticas que já vi, fazendo inteira justiça ao livro. O seu Belisário também é muito bom.
Graves era poeta, mas vivia da prosa e especializou-se em romances históricos. Escrevia também contos em revistas. Um desses contos, publicado nos anos 60, O Senhorio, Visão da Roma Imperial, é uma brilhante paródia aos seus romances sobre o imperador Cláudio. Trata-se da história de um dia na vida de um senhorio romano, um homem rico que nos conta as suas actividades. O texto tem um fim surpreendente (mas que grande surpresa!), personagens riquíssimas, a cultura clássica sólida do autor, mas também o interesse contemporâneo, pois os problemas humanos não mudam. O conto é simples na construção e tem uma fina ironia em crescendo, mas subtil e de grande efeito. O imperador Cláudio aparece na história, numa cena meio bizarra que funciona como um piscar de olho do autor aos seus leitores mais fiéis.
Neste conto, e julgo que isso se aplica à obra de Graves, o detalhe histórico é um cenário que disfarça observações e experiências autênticas. O autor nunca esteve em Roma, mas a sua prodigiosa imaginação permite-lhe viver a vida do senhorio Egnatius, que é diferente dele, Robert Graves, mas que é também igual, pelo menos fisicamente, igual a um Graves mais novo, talvez dos seus 30 anos; mas semelhante no humor, na hostilidade, no nojo, na displicência, na invenção, na mundanidade, no cinismo e nos pequenos ódios. Nas emoções, enfim, que eram do mundo romano, mas que também podem ser nossas.   

2 comentários:

  1. que coincidência: encomendei hoje o clássico do Graves, já que perdi o que tinha

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  2. Excelente, meu caro. Obrigado pela visita e um abraço para ti

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