quinta-feira, 12 de agosto de 2010

A lista telefónica

O professor Herzog decidiu, por brincadeira, memorizar a lista telefónica de Budapeste. A lista de 1935 era, apesar de tudo, um livro grosso.
Os amigos ficavam espantados quando acertava nos números. Liam um nome e Herzog dizia o número de telefone da pessoa. Aquilo impressionava muito, pois revelava a prodigiosa memória do professor, cujas investigacoes, aliás, nunca produziram grandes resultados.
Enfim, veio a guerra, depois o regime comunista. A universidade perdera muitos dos seus talentos, mas lá continuava o prodigioso professor que sabia de cor a lista telefónica de Budapeste de 1935.
Uma vez, chegou um comissário do partido e ouviu falar naquele caso e nao resistiu a fazer ele próprio um teste.
Pediu uma lista telefónica de Budapeste do ano certo e escolheu um nome. Disse-o em voz alta e Herzog acertou logo no número.
"Como é isto possivel?" perguntou o comissário.
"Nao sei", respondeu o professor.
"Só é possivel porque vivemos num pais socialista", sentenciou o comissário e, por um instante, ocorreram-lhe várias ideias para usar aquele talento de Herzog. Mas logo se lembrou que o velho professor memorizara a lista telefónica de 1935, que pertencia a outra era.
O conhecimento inútil do professor Herzog perdeu-se para sempre quando o académico faleceu, de uma banal pneumonia, aos 87 anos, já durante a década de 70, quando o regime suavizava os seus rigores.
Mas na universidade ainda hoje se fala na fantástica memória do professor que sabia de cor a lista telefónica de Budapeste de 1935.
As pessoas que contam a história enganam-se muitas vezes no nome e chamam-lhe Herceg, e Ferenc em vez de István. Alguns contam mal o episódio do comissário e transformam Herzog num anti-comunista, que ele nunca foi. Outros, enganam-se no ano da lista telefónica. 1936 aparece na maioria dos relatos.
Herzog nunca descobriu o que procurava. Julgo que era fisico e que tentava chegar a uma teoria cosmológica, fazendo cálculos que se perderam num estúpido incendio, em 1999, onde se perderam também muitos papéis da universidade e uma lista telefónica de 1935.

Lajos Kormanyos
(traducao do hungaro de Luis Naves)

Sem comentários:

Enviar um comentário