A meio de uma dor psicológica aguda, o difícil é cingirmo-nos ao momento presente e aí, exclusivamente aí, buscarmos força. O presente é uma linha de cumeada grave, estreita e escorregadia, ladeada por duas encostas íngremes tombando impiedosamente: a encosta do passado, talvez a da esquerda, a encosta do futuro, talvez à direita.
É dolorosamente tentador resvalar o pensamento para as recordações de um passado que prometia não acabar, deixar o pé escorregar por um piso de momentos que não voltarão, chão que em tempos pareceu firme e agora nos atola, que urge evitar porque, só por ter existido e findado, nos fere a articulação da vontade.
E não é possível inclinarmo-nos demasiado na direcção oposta, sob o risco de cairmos no apetecível declive do futuro, para onde pendem cheios de tentação os nossos pés e a nossa esperança de que o presente termine rápido. Encosta quase tão traiçoeira quanto a primeira, atrai-nos para o que ainda não existe, obriga a nossa mente iludida a errar por terrenos que ainda não conquistámos.
É duro o percurso na trave olímpica do presente, onde apenas cabe um pé de cada vez. Onde a saída se resume a colocarmos o outro à frente desse, olhando em frente mesmo sem se ver nada, suando pelo equilíbrio, sem parar, sem correr, só um pé adiante do outro até que o carreiro desague no futuro suave do tapete plano e sem declives. Aí podemos, agora sim,espreguiçar a esperança em presentes melhores, alinhar as boas recordações como pérolas, porque existiram, e não como espinhos, porque acabaram.
Esplêndido.
ResponderEliminarGosto muito Cristina
ResponderEliminarObrigada aos dois :)
ResponderEliminarEra uma coisa antiga que tinha aqui. Felizmente não estou numa destas fases lixadas.
Fabuloso de facto o seu texto. E se não se enquadra ainda bem. Está de tal forma que juraria que sim :)
ResponderEliminarCara CF
ResponderEliminarEnquadrou-se em tempos e daí nasceu ;)
Obgda pelas suas palavras.
CL