Antes de existirem as redes sociais na internet, havia enorme veneração e respeito por quem tinha acesso ao espaço público da escrita, por exemplo, em jornais. Escrever e publicar um artigo de jornal era um feito digno da maior admiração e inveja. Nunca era exactamente pelo conteúdo do artigo, mas pelo facto de este ter sido publicado. E as pessoas diziam, "lá vai fulano, que publica artigos no jornal". Sabendo-se lido pela comunidade, naquele dia fulano podia entrar no café um pouco mais inchado. "Vossa Excelência leu o meu artigo no jornal? Pois eu digo lá que o governo é uma vergonha".
É fácil perceber que em dez anos a internet mudou isto tudo. As redes sociais democratizaram o acesso à escrita pública e, como acontece em todas as grandes aberturas democráticas, há os habituais abusos: as pessoas aproveitam para banalizar a sua nova liberdade, trocando mexericos, em vez de ideias que possam resistir até à edição seguinte.
A democracia incomoda os poderes e, no caso dos blogues, a crítica dos comentadores que tinham acesso exclusivo à escrita pública centra-se na agressividade do discurso dos recém-chegados. Curiosamente, estes comentadores esquecem que a imprensa mudou muito nos últimos cem anos, devido à concentração de títulos. Onde havia 30 ou 40 diferentes títulos, na sua maioria panfletários, há agora cinco ou seis, todos muito certinhos. A opinião nos jornais tornou-se profissional e séria, mas menos diversa e também menos combativa. As polémicas desapareceram por completo.
Daí que as redes sociais, a blogosfera em primeiro lugar, tenham preenchido o crescente vazio da chamada comunicação social. Não haverá muitos Cíceros, mas hoje, qualquer pessoa alfabetizada pode ter um blogue e escrever o que pensa. A dificuldade está na escolha e há fenómenos próprios do meio, como por exemplo o efeito bola-de-neve que dá excesso de visibilidade a autores menores. Por vezes, a diversidade mais parece a que existe nos hipermercados, algo ilusória, em que há dez marcas do mesmo produto, sempre com o mesmo fabrico e preços finais diferentes.
Mas por muitas ilusões que as redes sociais tragam, por muitas desilusões, existe uma democratização do espaço público da escrita, o acesso à voz do cidadão, uma partilha de ideias alargada. Sim, circula muita banalidade. E qual é o problema? Não eram afinal também banais aqueles artigos muito importantes que já toda a gente esqueceu? E não é a nossa vida, afinal, uma sucessão de interessantes banalidades?
É por na vida existirem tantas banalidades que precisamos de algo melhor e que não seja banal. Está visto que nas redes sociais é cada vez mais difícil de conseguir alcançar isso.
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